segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Sexto cântico

Um corpo, um sonho
pele que me contém
e que, furada em poros,
me liga àquilo de que me separa.

Nos poros, Ele.

É assim então que -
porque sou furada na pele
encontro aquele que me contém.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Vislumbre

A terra, quase já pronta a viver sem o pássaro selvagem, o viu de longe.
Apesar da distância, reconheceu suas cores e rapidamente uma relva suave a cobriu por inteiro.
Fertilizada, mas ainda impotente, soube que permanecem unidos.

(Agosto de 2012)

domingo, 5 de agosto de 2012

O umbral

A menina cruza o umbral
- susto -
A menina para sob a fumaça da encruzilhada
- dor -
A menina prossegue
e o que vê depois da fumaça
é translúcido
A luz cristalina e absoluta
revela o que a fumaça escondia:
o vazio pleno de nada

Extasiada, não sente saudade de tudo o que era.
Apaixonada, se lança no meio da luz cristalina e sabe
que tudo o que era será o adubo a fertilizar o que virá a ser.
Como uma planta que nasce no tronco caído da árvore morta.

Mas a menina tem seu segredo:
a luz a convida para ser,
e o convite é uma permissão -
é a oferta do direito de ser.

(Agosto de 2012)

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Impotência

Dizem que a vida é vasta.
Pois sim, a vastidão do céu é aterradora.
Mas a vida, a vida mesma,
a minha, a sua, uma vida qualquer -
ah, a vida teme a vastidão e se recolhe.
E passa-se o tempo de uma vida circulando o mesmo buraco.
Dia após dia, circulando o buraco.
Noite após noite, circulando o buraco.
Sonho após sonho, circulando o buraco.
E quando uma alegria repentina leva para longe,
o buraco chama de volta como um ímã poderoso.
E quando uma tristeza pesada quase joga para dentro -
e alguns de fato caem sem chance de volta -
o buraco expele para fora como um corpo expele um espinho.
E a vida volta ao seu dia após dia, sonho após sonho.
Longe, longe, longe
longe do buraco, haveria de ser o paraíso,
Pasárgada,
lá onde o peso do meu corpo sucumbiria à força das minhas asas.

(Agosto de 2012)