segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Desejo

O luar de repente tão distante,
uma menina sentada
na esperança pungente de uma mão que segure a sua.
Cicatrizes que se sucedem a cada laço perdido.
Menina solta na solidão.
Ardendo mesmo segura pelos Teus braços.
É que é de amor em corpo que ela carece.
E Tu, que criaste esse buraco, não o pode preencher.

domingo, 29 de novembro de 2015

Deslumbre

Um João-de-Barro construiu casa bem acima da minha varanda.
Ai meu Deus!

sábado, 28 de novembro de 2015

Pássaro

Mente livre
corpo livre
alma livre
livremente
junto a Ti.
A Teu corpo
que é como meu corpo.
A Tua alma
que é inteira minha alma.
A Tua mente
que é mais real que a minha.
Junto a Ti,
eu sou.
Livre pássaro.

(Novembro de 2015)

domingo, 22 de novembro de 2015

Desarranjo

Me derramo em dor
e o vejo partir sem mim.
Chamo, chamo, chamo,
e minha voz não o atinge mais.
Deixo fluir tudo que quer sair,
me derramo em flor,
e meu perfume não o toca mais.
Nada sei. Nada posso.
A não ser me deitar em Ti.

(Novembro de 2015)

domingo, 8 de novembro de 2015

Bestamar

Aprendendo a amar:
Fechar os olhos e os ouvidos 
e abrir apenas os sentidos da alma.
Eliminar palavras ocas como defeito, erro, mentira ou coisa assim.
Criar palavras flores como reamar, sempreamar ou bestamar.
Deixar-se cair, não temer ser bobo.
Regar todas as sementes
e absorver o que emana do que morre.

Olhar fundo em Teus olhos. E nem temer.

(Novembro de 2015)

Aforismo 20

Quero para mim a vagareza do pequizeiro do meu quintal.

(Novembro de 2015)

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Pai e mãe

Meu pai mentia.
Minha mãe se amargurava.
A mentira e a amargura me guiavam
e em mim nasceu o horror -
a mentira e a amargura me tonteiam.
Não minto, não me amarguro
agora que me abri em mulher.
E em mulher, diante da tenra fruta da vida
abro a boca e dela sai o que sou
abro os braços e deles saem amor.
Perdoo.
O pai. Mentira amorosa.
A mãe. Verdade amargurada.
E a vida agora me mostra:
Tudo são os caminhos da dor.
Longe de Ti.

(Novembro de 2015)

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Avesso

Quando olho para dentro
e para fora
e só o que vejo é amor,
caio em Tua terra
e me entrego.
Felicidade.
E sigo sem saber
o que fazer com tudo isso.
A dádiva nas mãos,
o caminho tortuoso,
o medo de cair.
Pernas bambas, mãos trêmulas.
O que fazer quando tudo é felicidade?
Quando não se quer conquistar,
quando a dor foi aceita,
a saudade perdoada,
e o mundo todo amado?

Preciso revirar-me ao avesso de mim.
E recomeçar.

(Outubro de 2015)

sábado, 12 de setembro de 2015

Surra

Uma mão pesada
me separou de Ti
a vida toda.
Na canto dos cabelos dele
- que eu tocava com mãos bem livres -
o amor todo que eu buscava.
No olhar dela
- que me persegue -
o susto de não poder amar.
E eu lançada entre ele e ela,
espantada sem Ti.
Agora, a saudade dele,
e ainda os olhos dela
me surrando
por Te amar.

(Setembro de 2015)

domingo, 2 de agosto de 2015

Aforismo 19

O fogo é a origem.
Sexo, semente, junção, amor.
O fogo é Deus.

(Agosto de 2015)

Espera

Meus olhos estão fundos
como um lago perene
parado
profundo.
Meus olhos estão parados
à espera do calor das Tuas mãos.
Me salva.
Me salva de mim.
Das correntes que construí pelo caminho,
da chibata com que me atinjo,
das feridas por onde sangro sem Ti.
De todo caminho sem amor a que já me lancei.
De toda rota de fuga do amor que já tracei.
Me salva de sofrer, meu Pai, me salva.

Movimenta meus olhos
com as ondas do Teu mar.
Me esquenta no fogo do Teu amor.
Me põe na Tua fornalha, meu Pai,
que da vida quero o fogo.

Me salva de ter medo, meu Pai.

(Agosto de 2015)

sábado, 11 de julho de 2015

Luz e relva

Desce sobre o mundo a luz dourada.
Cada canto de relva nova reluz.
Eu caminho torta por entre luz e relva
e tombo sem peso.
O que me preenche não me sustenta.
A luz e a relva nada me pedem.
Continuo.
Caminho com a luz
e o nada que sou se junta ao mundo.
Eu, mundo, relva e luz -
um canto só
cantinho de Ti.

(Julho de 2015)

domingo, 28 de junho de 2015

Fome

A caminhada árdua
me levou ao ponto mais alto.
De lá vi cumes maiores que o meu
vi montanhas
várzeas e platôs,
vi a memória se perdendo como luzes em baixa.
E de lá me vi.
Menina.
Uma jardineira e uma fuga em mente.
Um corpo cheio, uma alma repleta.
Me vi menina.
E nos olhos da menina a esperança.
Fome intensa de vida a mais.
Fome de Ti.

Ah, menina, quanta coisa a te contar.
Quantos caminhos de idas e voltas
choros e risadas
beijos e desencontros.
Quanta cor e dor
e sempre intensa, a fome.
Na travessia do rio
no gozo
no pranto
no encontro do mar,
menina.
Quanta vida a te contar.
E toda, toda ela,
feita só para ti
para honrar teus olhos amedrontados
feito bicho acuado.
Foi só por tua causa, menina,
que segui sempre em frente
depois de cada queda
e de cada pedra.
Para honrar teus olhos
de espanto e dor.
De amor.

(Maio de 2015)

Nascer

Folhas todas esparramadas
secas, verdes, inteiras, quebradas,
as folhas todas de mim esparramadas.
E eu, cérebro disforme,
desencontrada, caída no monte de folhas.
Brinco. A criança se joga no monte.
Brinco. E não sei.
Não sei de mim.
Não sei de cada folha.
Mas uma cicatriz é rasgada a cada folha quebrada.
E dentro da ferida a chance
a chance única, a chance renovada.
É da ferida reaberta que se pode nascer.
E é assim, sem saber e na dor
que busco Teu sopro
e nele me entrego.

(Junho de 2015)

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Pequena flor

Flores se amontoando
como num ninho.
No meio delas a flor feia
que sem dó peguei nas mãos -
sem perdão, amei a feiura.
Tomada e tocada, inteira e feia,
vi crescer em mim a beleza real
do Teu sopro.

(Abril de 2015)

Regaço

Ah, a menina feia.
Ah, a menina bonita.
Que me importa?
Na beleza ou na falta dela
o brilho do Teu rosto foi sempre a luz única
que me aqueceu a vida.
Ah, a menina perdida.
Ah, a menina em Teu colo.

(Abril de 2015)

segunda-feira, 2 de março de 2015

Longe de Ti

Mais uma vez,
o círculo de luz se desfez.
Fui lançada de volta
no comum da vida
em que cada cor
e cada luz
só surgem na medida
da necessidade.
Nunca na medida do sonho.

(Março de 2015)

sábado, 10 de janeiro de 2015

Amor

Quando ele vem
meu coração se altera
meu corpo se alegra
minha alma fica em festa.
Quando ele vem
tudo o que não importa
desaparece.
E com ele
a festa acontece.
Que rima simples.
E não é assim?
Tudo o que importa é simples.

E o deus nos olha de esgueira.

(Janeiro de 2015)

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Horizonte

Na linha do horizonte
meu sorriso se desfaz
e enquanto espero o anoitecer
me perco de mim
embrenhada em Ti.
Sem sorriso nem nada
sou um ponto qualquer
na linha do horizonte
onde céu e chão se encontram.
Mas embrenhada em Ti
recosto suavemente
na linha em que me perco
e reencontro o sorriso
perdido na distância de Ti.

(Janeiro de 2015)