sábado, 24 de março de 2012

Sem fim

uma gota
um sonho
a chuva
um canto
recanto, reconto
e eu dentro
feito gato no novelo de lã
e eu dentro
feito um pombo na caixa fechada
presa -
da prisão, a soltura
da soltura, um medo
eu dentro, nem temo
eu solta, um susto
um susto, um sonho
eu simples, que coisa -
eu mesma no colo do gato
no dentro do novelo
no conforto do sonho
eu solta no perigo da rua
no de dentro da vida
eu solta sem medo
sem rumo nem nada
eu que nem sei
que sonho, que medo, que nada
eu simples, vivendo
eu nada, que nada
no meio da vida
da vida que é nada
da vida que é minha
um nadinha de nada
mas tão bonitinha
feito o sorriso do menininho
que nem sabe de nada
e vivo danada
danada da vida
zombando de mim
que simples, que coisa
que gozo de nada
que nada de gozo
que coisa mais boba
uma vida que passa
que coisa mais linda
uma vida de graça

(Março de 2012)

terça-feira, 13 de março de 2012

O oco

E no oco do mundo havia um segredo: aquele que nos move incógnito e que revolve as coisas até elas se transformarem em seus contrários, mistura de amor e esquecimento que forma a massa nova da terra aberta à germinação.
E no futuro há apenas o sopro que vem do oco das coisas.

(Março de 2012)

segunda-feira, 12 de março de 2012

A menina e o diamante

A menina, com as mãos vazias, já não sente saudade do diamante perdido.
Percorreu ruas novas, revolveu as lembranças.
Até que um dia topou com uma pedra qualquer pelo caminho -
a pedra do poeta -
e caiu exausta,
e enxergava claro,
e o que via doía e libertava:
O diamante era oco.

(Março de 2012)

terça-feira, 6 de março de 2012

Pedro Paulo

Há algum tempo venho cozinhando a ideia de que toda pessoa tem a missão de construir uma explicação do mundo ao longo da sua vida. Hoje por acaso encontrei no jornal alguém que fez isso.
Ele se chama Paulo Marques de Oliveira, ou Pedro Paulo, tem 86 anos, mora em Salinas e escreveu coisas assim:
"Deus não tem ôlho de carne, semilhante do homem, o ôlho de Deus é outro sistema."

(Março de 2012)

domingo, 4 de março de 2012

sábado, 3 de março de 2012

Expurgação do ódio pela morte

A menina se levanta, como um gigante, da terra exaurida.
De sua altura gigantesca, olha o mundo sem dó.
Ao longe, bem ao longe, vê o voo do pássaro.
Empunha arco e flecha e atira.
O pássaro cai. A menina volta ao seu tamanho pequeno.
Suavemente, pega o regador e nutre o pé de amora recém plantado.

(Março de 2012)