quarta-feira, 29 de março de 2017

Aurora

O pequizeiro está sem folhas,
sem galhos, só tronco.
Olho e choro, quem fez assim?
Não há ninguém por perto, eu e ele, só.
Tronco ferido, eu partida.

O pequizeiro foi podado.

Inteiramente podada, eu sigo.
A dor lancina e faz sangrar
cada cicatriz.
Junto à dor, a espera.
Foi Ele quem fez a poda.
E eu não sei nada do novo por vir.

sexta-feira, 24 de março de 2017

Quero

Quero laços.
Tropeço sempre.
Mas ainda quero. Quero laços.
Tropeço, caio e quero.
Ser estranho, lagarto na pedra quente.
Ser só.
Sozinho.
Mas quero laços. Quero.
Desfaço, desmonto, desisto, mas quero.
Pari, criei, amei.
Compartilhei, ajudei, dei.
Apoiei, pedi, chorei.
Acompanhei, senti, vi.
Ouvi.
E ainda quero, quero laços.
Da pedra quente me lanço -
para a pedra quente eu volto,
ser estranho que sou.
Mas quero, quero sempre, quero laços.

terça-feira, 21 de março de 2017

O que sou

A identidade é a flor perdida no descampado.
O detalhe.

O que não é frágil
é o que não é o eu em mim.

terça-feira, 14 de março de 2017

Outro Anjo

Para o Matheus

O menino foi
e eu me calei.
A palavra atravessada e nunca dita
se perdeu e corre agora
no tempo já ido.
Cuidado, menino,
não corre assim,
não foge assim,
não voa não, menino,
olha pra mim.
Ele só sonhou
- voou -
sem grades
sem medos.

Não voa não, menino.

Vem, Amor,
fala por mim:
Cuidado,
não voa,
não.
Ou diz assim:
Voa, menino, voa.
E a Tua voz corre com ele.

Volta, Amor,
e consola a gente toda que ficou
sem asas.

Que voo é esse, menino,
que ninguém viu?
Que voo é esse, menino,
que de tão alto machuca assim?

Volta, Amor,
com Teu sopro que só consola.
Volta, Amor,
e põe o sonho do menino no peito de quem só chora.